Essas fotografias do Nordeste em Bici foram tiradas entre julho e outubro de 2021, durante uma viagem de bicicleta entre a Paraíba e o norte da Bahia, cortando pelo litoral os estados de Pernambuco e Alagoas, e dando umas voltas maiores no Sergipe. Embora tivesse uma máquina na bagagem, acabei usando com mais frequência o celular, que eu costumava carregar no bolso, principalmente na estrada.
Falar em beleza é pouco, diante de tanta imensidão e generosidade vindo da natureza e dos seres que a habitam. Falar em inconsciência, maldade e estupidez também seria muito pouco para descrever a atitude daqueles que a destroem e exploram seus recursos de maneira irresponsável, sem parar para olhar esse espetáculo, sem sequer considerar as vidas que ali existem.
Quatro meses de descobertas e peregrinações não se resumem em um punhado de fotografias. Apenas podemos relembrar e transmitir com imagens alguns momentos esporádicos de beleza ou de emoção, de riso, afeto ou surpresa, que marcaram uma vivência infinitamente maior – mas que de alguma forma, precisava ser compartilhada.
Espero que essas poses de estrada – realizadas entre o sul da Paraíba e o norte da Bahia, e apresentadas no meu facebook em completa desordem – tragam com elas um pouco de vento nordestino, e nos façam sentir, mesmo à distância, o quanto essas terras e águas merecem ser cuidadas.
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O acervo “CRÔNICAS FOTOGRÁFICAS” é o fruto de doze meses de ensaios e reportagens à sombra do Corcovado, acompanhando, longe dos circuitos turísticos, dezenas de coletivos autônomos que atuam no centro da cidade ou na dita “periferia”.
De um ano 2018 marcado pela prisão do ex-presidente Lula, pelo assassinato da vereadora Marielle e por uma campanha eleitoral de extrema violência, ele traz também registros de ocupações, eventos culturais (cada vez mais) independentes e militantes, ou de atos políticos de luto e luta.
Sem escapar do ponto de vista de “quem é de fora”, ele tenta olhar
de forma íntegra para a paisagem urbana em toda a sua diversidade,
seja dentro da favela, no meio do carnaval ou junto com movimentos
sociais.
Coleção exposta em Porto Alegre (2019) na galeria Alimentarte e no Travessa Café.
Todas as fotos no flickr : @Charlotte Dafol
A cidade de Rio de Janeiro apresenta uma necessidade habitacional de 420 000 moradias enquanto existem outros milhares de imóveis ociosos no município. A área ocupada pela Comunidade Povo Sem Medo é uma antiga fábrica têxtil, desativada há décadas, e acumulando uma dívida que ultrapassa dez vezes o próprio valor do imóvel.
Em poucas semanas, a ocupação Povo Sem Medo se transformou num pequeno bairro comunitário a céu aberto, sem polícia, sem tráfico, sem carro, mas cheio de crianças brincando livres nas ruas que surgiram entre as construções.
Desde os primeiros dias e durante mais de um ano, acompanhei essa teimosa aventura coletiva, registrando as incomensuráveis transformações do lugar e dos seus protagonistas, e fortalecendo com eles profundas relações de amizade e admiração.
Ao chegar no espaço, encontrado insalubre e tomado por mato, cada núcleo familiar recebeu um lote demarcado no chão e numerado, onde lhe restava limpar e erguer a sua casa, reaproveitando qualquer pedaço de madeira encontrado na rua e contando com a solidariedade dos demais ocupantes. Se hoje em dia todos os lares têm fogão e geladeira, no primeiro mês, a cozinha era coletiva e a comida vinha principalmente de doações.
Coleção exposta na École Normale Supérieure (ENS Ulm, Paris, 2018), no Espaço 900 e na Casa Dê (Porto Alegre, 2019).
Publicada em Vacarme n°86 (février 2019).
Todas as fotos no flickr : @Charlotte Dafol